domingo, 24 de março de 2013

É noite...

A dama vestida de negro,
esplendorosa e conselheira,
chega lenta e solitária.

Com a sua varinha mágica
liberta o silêncio, transfigura
o espaço, cuida e regenera.

No silêncio ouvem-se ecos longínquos,
sons inéditos, irreconhecíveis,
 vozes sussurradas.

E com o passar da noite,
agitam-se os seres adormecidos
anseiam o dia, completa -se o ciclo.
DC

quarta-feira, 20 de março de 2013


"Como um pássaro cantando na chuva, deixe memórias agradáveis sobreviverem em tempos de tristeza."
Robert Louis Stevenson

quinta-feira, 14 de março de 2013

Boca que fala o que coração sente


   Em cada gesto do quotidiano
 Pressente-se…
   uma revolta contida num olhar sombrio
   uma mensagem conturbada
   nos gestos bruscos do vizinho tresloucado
Sente-se
  a frieza das palavras que ferem corações
  o pensamento alucinado nas letras deixadas à solta
  numa angústia transfigurada pela tormenta da vida!
Assiste-se apático …
  à queda da razão e à ascensão da desilusão!
DC

Forgiven


Ó noite, porque hás-de vir sempre molhada!

Ó noite, porque hás-de vir sempre molhada!
Porque não vens de olhos enxutos
e não despes as mãos
de mágoas e de lutos!

Poque hás-de vir semimorta,
com ar macerado e de bruxedo,
e não despes os ritos, o cansaço,
e as lágrimas e os mitos e o medo!

Porque não vens natural
Como um corpo sadio que se entrega,
e não destranças os cabelos,
e não nimbas de luz a tua treva!

Poque hás-de vir com a cor da morte
- se a morte já temos nós!
Porque adormeces os gestos,
porque entristeces os versos,
e nos quebras os membros e a voz!

Porque é que vens adorada
por uma longa procissão de velas,
se eu estou à tua espera em cada estrada,
nu, inteiramente nu,
sem mistérios, sem luas e sem estrelas!

Ó noite eterna e velada,
senhora da tristeza, sê alegria!
Vem de outra maneira ou vai-te embora,
e deixa romper o dia! 


                                                                    Eugénio de Andrade, As mãos e os frutos

quarta-feira, 6 de março de 2013

As palavras


São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.

Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.

Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.

Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?
 Eugénio de Andrade